Guerra da Restauração
Descrição
A Restauração da Independência ou Restauração de Portugal foi um processo histórico que procurou a autonomia portuguesa após sessenta anos de União Ibérica (1580-1640).
A União entre as coroas nunca teve aprovação homogénea. Em Portugal, havia uma grande rejeição popular ao mesmo tempo em que se assistia ao interesse de alguns grupos da nobreza, do clero, da burguesia e dos comerciantes por uma economia mais estável e um exército mais forte. Em Espanha existia a preocupação do poder tirano, com seus negócios e domínios.
Os primeiros descontentamentos de Portugal para com esta União tiveram início com a ascensão de Filipe II ao trono, tendo como argumento a sua ilegitimidade consanguínea e o não cumprimento de algumas cláusulas do acordo feito perante as Cortes de Tomar, em 1641. A Restauração teve o apoio dos nobres e aristocratas, que se vinham a organizar desde 1638 contra as políticas de descentralização e neutralização, administradas pelo duque de Olivares.
O novo rei não foi tão aclamado como o esperado e ainda teve de encarar a desconfiança do povo, que aguardava o retorno do desaparecido D. Sebastião que, pensavam, libertá-los-ia do julgo espanhol. Foi o messianismo Bragantino que acabou por ser utilizado para legitimar a ascensão de D. João IV, baseado na lealdade dos nobres e na dinastia que descendia de D. Manuel. Acompanhado do surgimento do nacionalismo na figura do Quinto Império, disponibilizaram-se para relacionar as glórias do passado e as vitórias do futuro.
No meio dessas divergências internas, D. João IV tentou traçar uma política externa de alianças com os países inimigos de Espanha. Neste período, os conflitos entre espanhóis e portugueses, para a manutenção do poder estendia-se pelos domínios que ambos possuíam no ultramar, assim como outras disputas conhecidas como: Guerra Luso-Holandesa, que acabou no ano de 1663 e a Guerra dos Trinta Anos, finda em 1648. A monarquia dual da dinastia filipina terminou com o Tratado de Lisboa, em 1668.
Antecedentes e contexto
União entre os reinos
O período da União entre as Coroas Ibéricas (1580-1640) teve início com a ausência de um rei para o trono português, após o desaparecimento do rei D. Sebastião (1557-1578) na batalha de Alcácer Quibir, no Norte da África.
D. Sebastião herdou o trono de Portugal com apenas três anos de idade, o que causou a necessidade de um período regencial até que ele tivesse idade suficiente para assumir o trono. A primeira Regência foi atribuída à sua avó D. Catarina de Áustria (1557-1662), seguida por seu tio-avô Henrique I de Portugal (1562-1568), que também foi cardeal-arcebispo de Lisboa e Arcebispo emérito em Évora. Em 1568 D. Sebastião ascendeu ao trono com apenas catorze anos de idade, encontrando um forte predomínio de leis relacionadas à religião e à defesa militar deixadas pelos seus antecessores.
Nas tentativas de conquista de D. Sebastião, podemos perceber a relação entre a milícia, a religião e a política. A Igreja viu nessas conquistas uma possibilidade de expansão já que se tornaram mais um meio de aquisição de recursos. D. Sebastião não mediu esforços para arrecadar fundos, taxou o povo, pediu empréstimos a estrangeiros e cristãos-novos e chegou até a pedir ajuda diplomática ao seu tio Filipe II, rei de Espanha e futuro sucessor do trono português.
O desaparecimento de D. Sebastião em Alcácer Quibir, além de deixar um rombo na receita do país, causou a diminuição do exército aristocrático, que foi morto ou aprisionado.
A crise da monarquia portuguesa e as dúvidas sobre o momento que se estava a viver, em relação às mortes e prisões, bem como as incertezas do destino que a nação iria tomar no futuro, resultaram em dúvidas quanto à escolha de quem ocuparia o trono e não se tornaria uma ameaça à glória portuguesa, visto que D. Sebastião era o último herdeiro da Dinastia de Avis. Esta crise dinástica contou ainda com a intensificação da crise económica, por conta dos resgates dos prisioneiros de Alcácer Quibir, a corrupção das elites, o desinteresse da burguesia em prosseguir com a dinastia de Avis e a sombra e corrupção do poderio militar espanhol.
D. Henrique (1578-1580), ao regressar ao trono português, sendo o último descendente direto da dinastia de Avis, deparou-se com outros candidatos que tinham interesses na Coroa. O seu primeiro objetivo foi resgatar os prisioneiros na África, algo em que foi bem-sucedido. Contudo, as dificuldades em governar e a debilidade da sua saúde goraram o seu segundo propósito, que era nomear um seu sucessor. Em 1579 convocou as Cortes na procura de uma solução, mas não contou com muitas alternativas. Assim, em 1580, foram nomeados cinco governadores regenciais. Em 31 de janeiro do mesmo ano, D. Henrique morreu de tuberculose, deixando o caminho aberto para D. António, filho ilegítimo de Luís de Portugal, que era descendente direto de D. Manuel.
D. António tinha a aceitação popular o que não contribuiu em nada para cessar as investidas de Filipe II de Espanha, que demonstrava que apesar da ilegitimidade sanguínea era a melhor escolha para as dificuldades portuguesas. No dia 20 de junho de 1580, ante a decisão do conselho de governo, António Prior do Crato foi proclamado rei de Portugal em Santarém, sendo aclamado em várias localidades do país. O seu governo durou trinta dias, acabando por cair com a derrota das suas tropas pelo exército espanhol comandado por Fernando Alvarez de Toledo, Duque de Alba, na batalha de Alcântara, em agosto de 1580. Além dessa perspetiva bélica, Filipe II tinha como vantagem habilidades diplomáticas e a estabilidade financeira espanhola para prometer uma união baseada na autonomia portuguesa, pautada numa “boa administração e de manutenção da paz interna”. Filipe II não economizou meios para conquistar o trono português e fez uso da debilidade da nobreza e do clero nas suas investidas.
No meio desta crise de sucessão nas Cortes de Tomar, no dia 16 de abril de 1581, ao prestar juramento solene, Filipe II de Espanha, torna-se Filipe I de Portugal. A partir desta data o novo rei dispôs-se em reconhecer e outorgar os vinte e cinco capítulos apresentados pelos Três Estados do Reino. A afirmação da autonomia de Portugal e muitas das suas declarações procuravam a "manutenção da identidade nacional mais ao nível dos símbolos do que das realidades de que era tecida a vida quotidiana de um povo livre e independente". O compromisso assumido nas Cortes de Tomar deveria guardar “os privilégios, graças e mercês da nação portuguesa”.
Os dois reinos partilhavam então a mesma legislação: as Ordenações Filipinas. Felipe II ao instituir um novo código, dizia não ter a pretensão de prejudicar os novos súbditos, já que afirmava respeitar os direitos e instituições dos portugueses. As Ordenações Filipinas estenderam-se a toda a União Ibérica, contudo atingiu a sociedade de maneira estratificada. Tal pode ser verificado com base nas diversas punições para o mesmo crime dependendo do status social de quem o cometeu.
Até 1640 Portugal esteve sobre o controle da casa dos Habsburgo, numa monarquia compartilhada com Espanha, na qual as instituições portuguesas foram conservadas.
A tentativa de usar a política de casamento para a unificação entre Portugal e Espanha não foi bem-sucedida, mesmo com o casamento de Dona Luísa de Gusmão com o Duque de Bragança, o resultado foi contrário ao que se esperava.
Divergência entre Reinos
Durante o período da União Ibérica foram tomadas várias medidas para impedir possíveis animosidades entre o reino português e a monarquia espanhola. Nas quatro primeiras décadas do governo dos Habsburgo em Portugal garantia-se com facilidade a comunicação entre o rei e o reino. A garantia de uma boa relação assinada durante as Cortes de Tomar visava a autonomia portuguesa. Porém, naquele acordo constava a residência do rei em território português e visitas contínuas, a exclusividade do Conselho Ultramarino com os portugueses, o uso da língua oficial e a supressão das taxas alfandegárias e etc. Para prestar contas ao rei, manter a prática e orientar sobre a política geral foi criado o Conselho de Portugal.
Mesmo tendo por base essas referências as divergências entre os dois reinos começaram a surgir com o embate entre os interesses portugueses contrários às medidas castelhanas, culminando assim no movimento secessionista. Filipe III ascende ao trono, mas não possuía as mesmas habilidades do pai. Assim, o poder de Portugal vai passando de mão em mão e as mudanças que ocorreram nas primeiras décadas do século XVII mostram uma política centralizadora que estava a ser adotada por Madrid como já acontecia na “Catalunha, Aragão, Navarra, etc.”
A principal insatisfação estava relacionada com a pressão fiscal feita por Espanha sobre o território português. As insatisfações fiscais portuguesas não eram um movimento homogéneo, já que a ordem jurídica era baseada em privilégios, formando assim um movimento com diferentes reações.
O povo, que sustinha a maior parte da contribuição tributária, pediu para que a nobreza e a Igreja, que até então mantinham privilégios fiscais, contribuíssem com o pagamento de impostos. A nobreza para fugir das despesas, alistava-se no exército para se eximir da contribuição.
Os comerciantes não desejavam economizar na defesa das suas rotas marítimas, os oficiais não queriam que se diminuíssem os seus salários e nem os seus ofícios. Os pobres desejavam acabar com a diferença quantitativa de tributo entre eles e as elites económicas.
Além das queixas sobre a fiscalização económica, a nobreza tinha dificuldade em comunicar com o monarca, pois era privada dos ofícios no palácio. E os senhores viam os seus títulos serem desvalorizados pela infiltração de castelhanos no seu território. O princípio do indigenato garantido pelas Cortes de Tomar, que reservava os ofícios de Portugal para os naturais deste território estava a ser afetado.
Todos estes acontecimentos fizeram parte da complexidade de motivos que levaram os portugueses a aderirem ao movimento de Restauração e a desejarem o regresso de um bom governo, sem alterações ilegítimas do viver político.
Cultos milenaristas
Esta situação levou à influência de uma produção de boatos e feitiçaria. Motivado pelo pânico coletivo que havia sido introduzido teve como resultado a instauração da crença sebastianista.
O Sebastianismo tornou-se num dos episódios mais envolventes deste período devido à atmosfera mística das profecias. O rei D. Sebastião nunca regressou depois de sua derrota na batalha o que originou especulações. O número de sebastianistas aumentou, já que tinham fé que ele seria como Messias e voltaria para salvar Portugal. Esta crença foi passando ao longo de gerações. O mito do Sebastianismo espalhou-se por ser estar ligado ao homem barroco que idealizava e fugia da realidade.
A mística sebastianista foi marcada pela melancolia. Deste modo, D. Sebastião sofria e seus súditos deveriam sofrer também. O Sebastianismo seria: “Uma questão sentimental e não política de anticastelhanismo, de nacionalismo, de desagravo”.
A crença sebastianista foi utilizada por alguns conjurados como inspiração. Os sebastianistas mais ricos preferiam esperar a volta de D. Sebastião do que apoiar D. João. A crença popular no sebastianismo projetava um dia incerto para o retorno do rei e a libertação do povo português, muitos D. Sebastião falsos apareceram, entretanto, e muitas revoltas foram reprimidas. Assim, o processo de espera era também marcado pelo conformismo. Esta melancolia e frustração foram alimentadas pela crença de Providência Divina que iria ser benevolente com Portugal na hora da ação.
Acreditavam em determinismo astrológico que por mais que fosse proibido pela igreja, pessoas como Padre António Vieira acreditavam que Deus comunicava com os homens por meio dos cometas, pois no ano de 1557 anterior à perda de Dom Sebastião um cometa havia passado no céu, sendo considerado um sinal. As suas previsões escandalizavam a corte e para fugir a possíveis punições, o Padre António Vieira migrou para o Brasil. Nos seus sermões dizia que Portugal estava a ser punido e pagava com isso a sua independência, tornando-se prisioneiro de Castela. Entretanto, dizia, haveria o momento em que o sofrimento e o castigo iriam acabar.
A partir das promessas feitas pelo ermitão Afonso Henrique, a restauração estava prevista para acontecer com D. João IV na décima sexta geração dos Braganças. Aconteceria indo contra a interpretação sebastiânica de que D. Sebastião iria retornar para salvar Portugal. Iniciou-se assim um período de mobilização em que se acreditava no messianismo bragantino, com previsões de que o próximo príncipe vivia de fato em Vila Viçosa e estava à espera da Restauração.
Com este messianismo bragantino começou a surgir o nacionalismo na figura do Quinto Império, tendo em conta a dinastia e o imperialismo de Portugal. Saia-se assim do estado de fatalismo e imobilização e procuravam-se novas vitórias e conquistas. Posteriormente ao ano de 1640, o messianismo foi interpretado com um sentimento de lealdade pelos fidalgos, pois com a presença de D. Catarina descendente de D. Duarte e neta de D. Manuel, remetia-se para o passado de glórias de Portugal.
Toda esta movimentação levou a um sentimento pró-bragantismo que suprimia o sebastianismo, como por exemplo, Vieira em 1641 torna-se conselheiro de D. João IV. Elegeu Gonçalo Annes Bandarra como grande profeta e elevou a profecia do Quinto Império. Agiu transferindo as profecias de D. Sebastião para D. João. A crença no sebastianismo interferia então na estabilidade da nova geração e era vista como uma mítica popular rival à figura do atual monarca.
Insurgências de 1640
O início da guerra
A iniciativa de afastamento entre Portugal e Espanha deu-se com a legitimação da usurpação de Filipe II, ao retirar do trono o herdeiro legítimo de D. Catarina, o duque de Bragança. Isso sucedeu devido à tirania dos Habsburgo por não cumprirem as promessas realizadas perante as Cortes.
Numa Europa Moderna e monárquica era o dever do rei saber reconhecer a estabilidade das instituições e tradições. Morar no reino e governar com justiça fazia parte dessas esferas e, optando por não fazer isso os reis de Habsburgo foram, aos poucos, perdendo o poder de neutralizar a aristocracia.
Os portugueses que se encontravam desde início próximos a Madrid não foram capazes de mostrar a Filipe IV que seria mais sensato manter as suas obrigações com Portugal. Os portugueses que durante toda a União não haviam participado dos benefícios e viam-se frustrados, deram início a uma oposição. Em 1620 com uma economia instável, ataques anglo-holandeses e a possibilidade de levantes, a divisão existente entre os portugueses reforçaram as suas frustrações.
Somando a esses fatores o ministério de Olivares, procurava implantar um poder centralizador em Portugal e estava ciente dos benefícios da terra, principalmente no que se referia à política internacional e ao controle do ultramar.
Olivares, mediante o seu conhecido projeto “União das Armas” propôs uma castelhanização da Península em toda a sua extensão, o que se traduzia numa maior pressão fiscal.
A restrição e a neutralização do poder e privilégios dos portugueses, associada à pretensão de uma contribuição fiscal por parte dos nobres e clérigos, e a permanência de uma vice-rainha espanhola em solo português, somada ao descumprimento derradeiro realizado perante as Cortes de Tomar, ajudaram aos acontecimentos de 1640.
A ação iniciada a 1 de dezembro de 1640, liderada por fidalgos que no momento se viam privados dos seus poderes nobiliárquicos, teve como resultado o ataque que aprisionou a vice-rainha de Portugal, a duquesa de Mântua, Margarida de Saboia, e a morte do seu secretário de Estado, Miguel de Vasconcelos arremessado pela janela do Paço Real de Lisboa.
Para a vice-rainha a instabilidade que ocorria era mais um dos acontecimentos que existiam desde 1630 e não a considerava numa possibilidade de ser um golpe. Mas a chegada da notícia sobre a detenção da vice-rainha e do golpe em outras regiões poderia causar tumultos e era o que os conjurados não queriam.
A retirada de um monarca não poderia ser realizada por revolta popular, mas sim por pessoas de responsabilidade. Não era algo fácil de assumir, mas para a mentalidade europeia seria necessário explicar o que se estava a passar. Naturalmente que tal legitimou duas questões:
Primeiro teria de se saber se essa intervenção seria sido motivada por “amor à Pátria” e segundo se a forma de libertar Portugal seria concretizada mediante algum juramento.
O triunfo dos conjurados na deposição da monarquia espanhola ganhou repercussões em diversas partes do reino e a propaganda bragantina foi importante para chegar aos ouvidos do povo. Em Lisboa, os próprios conjurados saíram de suas casas, mas qualquer indício de desordem foi rapidamente controlado. Na manhã do dia seguinte o padre Nicolau liderou uma procissão de ação de graças.
O objetivo cumpria-se assim na versão oficial da Restauração: começou a propagar-se a mensagem de que o Golpe que tinha acontecido em Lisboa, ocorrera sem sangue, nem tumultos, sendo considerado um milagre.
Interesses
Os conjurados D. Antão de Almada e os irmãos Francisco Jorge de Mello são os três personagens que dão início à conspiração contra o reinado dos Habsburgo. Tendo como desculpa uma visita a Madrid para o pedido de favores ao rei espanhol, foram verificar a diferença entre os portugueses que ao longo dos reinados se tinham munidos de privilégios e favores, enquanto tantos outros compatriotas, que haviam lutado em guerras e viviam em solo lusitano, estavam em desvantagem com os que residiam em Madrid.
A insatisfação dos conjurados não é de causa nacionalista, na medida em que se torna uma ferramenta para conquistar a adesão de outros fidalgos. A aceitação do duque de Bragança para o trono “Induzem a crença de que os portugueses, o sentimento nacional e dinástico era tão vivo quanto a totalidade do reino”.
Apesar das diversas investidas dos conjurados para que o Duque aceitasse ser o próximo rei, as divergências de interesses entre D. João e os conjurados estava ligada à sua relação com os Habsburgo que desde o início da dinastia havia recebido vários favores - ser casado com dona Luísa de Gusmão, irmã do D. duque de Medina e ter sido chamado por Olivares para ser vice-rei em Milão.
A garantia da sua aceitação só se tornou realidade quando Madrid sofreu com a instabilidade na Catalunha, o que proporcionou a ação dos conjurados no 1º de dezembro de 1640. Como nos mostra a historiografia, D. João não queria ser morto pelo crime de lesa-majestade e sua estadia em Vila Viçosa manteve-se até tudo estar concluído.
A defesa de Portugal: as fases da guerra
A Coroa portuguesa vivia uma situação antagónica devido às relações que Espanha possuía com outros países, nomeadamente holandeses, ingleses e franceses que se tornaram seus inimigos. Os territórios portugueses passaram a ser alvos de ataque por todo o mundo, até mesmo pelos seus aliados.
Em 1640 Portugal encontrava-se numa condição indefesa, com uma população de 1,2 milhões de habitantes e grande parte de sua força armada a residir no Brasil, pelas expedições do ultramar. Havia quem estivesse em Flandres e em Itália lutando pela glória dos Habsburgo. A situação era desfavorável, a marinha não tinha navios, as fronteiras não estavam seguras, o exército não tinha armas nem munições e o país não estava em boas condições económicas.
Portugal teve que recorrer a algumas estratégias para ultrapassar a situação insustentável. Foi necessário identificar os problemas existentes para estabelecer a estratégia que seria adotada com a execução de uma guerra.
A situação dos portugueses era precária, com a ausência de um exército, em quantidade e qualidade, com a falta militar de nobres que estavam a servir as forças de Flandres e da Alemanha. A ausência de órgãos de defesa nacional e negócios estrangeiros, consequentemente, levou Espanha a transitar nesses meios.
Sucederam ameaças de assassinato ao novo rei e aos seus colaboradores, além de ataques a várias partes do Império, com insurreições em alguns locais. As dificuldades internacionais significaram um problema: “(...) para a maioria das potências da época, era mais rentável/útil ter Portugal como inimigo do que como aliado, pois assim se justificava os ataques na América, na África e na Ásia”.
A estratégia política foi iniciar uma “investida” diplomática para conseguir reconhecimento e aliados, em território nacional a principal preocupação foi manter a legitimação real. Os mecanismos económicos procuravam reduzir a exploração no Oriente, em busca de recursos financeiros no território português. As principais estratégias militares foram a criação do Conselho de Guerra e da Junta da Defesa das Fronteiras: “(...) procede-se a organização do 1º exército permanente que existiu no nosso país, revitaliza-se a marinha de guerra e definem-se as formas diferentes de resolver as crises para cada um dos desafios em cada ponto do mundo”.
As fases da Guerra de Restauração Portuguesa podem ser divididas em três partes distintas: A primeira fase ofensiva (1640-1646), a segunda fase defensiva (1646-1660) e a terceira final (1660-1668).
Primeira fase (1640-1646)
A fase ofensiva caracterizou-se pelo avanço das tropas portuguesas sobre as fronteiras com o território espanhol. No limite dos dois territórios não havia grandes obstáculos geográficos que impedissem ou interrompessem o avanço das tropas, o que facilitava as deslocações. Nesse momento a coroa espanhola travava guerras com outros territórios além do português, como a Catalunha, a Holanda e a França. A distribuição de recursos para as guerras era feita de modo desigual: o Exército Espanhol da Estremadura, responsável por sufocar a revolta portuguesa tinha poucos recursos para sustentar a guerra e obter resultados favoráveis a Madrid; já os outros exércitos obtinham mais dinheiros e recursos para manter as tropas em guerra.
Apesar de existirem combates que colocavam frente a frente portugueses e espanhóis, existiam também conflitos dentro de Portugal que mostravam que a aclamação ao golpe de dezembro de 1640 não era unitária. Em junho de 1641 houve uma proposta de contragolpe que questionava a aclamação de D. João, almejando o regresso de D. Felipe. O Arcebispo Noronha foi o responsável por encabeçar este movimento, com a presença de fidalgos, banqueiros, burocratas, eclesiásticos, etc. O objetivo era mostrar que nem todos os portugueses compartilhavam do sentimento antifelipista. Ao descobrirem a organização, os seus elementos foram rapidamente advertidos.
Além do exército de Estremadura existia o exército da Galiza que também era responsável por conter o avanço lusitano. Inicialmente, o exército da Galiza tinha 16 mil soldados em combate, por volta de 1664 este número caiu para 10 mil soldados em 10 terços de 10 companhias cada um.
A capital general da Estremadura era a cidade de Badajoz, enquanto o quartel-general lusitano ficava na cidade de Elvas, eram ambos muito usados na concentração de tropas. Os choques entre castelhanos e lusitanos foram reduzidos, pois o exército espanhol estava sem recursos para se manter em guerra.
No dia 26 de maio de 1644 ocorreu a batalha de Montijo, na qual as tropas portuguesas avançaram sobre o território espanhol e capturaram o quartel de Valência de Alcântara, um dos mais importantes do Exército de Badajoz, porém esta conquista não teve tanta importância estratégica no decorrer da guerra.
Segunda fase (1646-1656)
No ano de 1646 os portugueses enfrentaram dificuldades para realizar um acordo com os holandeses, sem sucesso, pois o governo luso insistia nas colónias americanas e asiáticas portuguesas. Nesse ano a intranquilidade reinava, face ao previsível fim da Guerra dos Oitenta Anos e o receio de perder as relações com a França. Consequentemente, João IV, apresentou a Mazarino uma proposta de divisão do reino e de proclamação de uma regência francesa nas terras peninsulares que, contudo, o ministro francês recusou.
A esperança de Portugal em ter reconhecimento internacional foi frustrada em 1648 e sua independência na Paz de Westfalia também. A mesma situação foi vivenciada pelos Pirineos.
Os diplomatas portugueses procuravam a colaboração da França, das Província Unidas e de Veneza, para tentar convencer Felipe IV a dar uma trégua de pelo menos cinco anos, contudo não alcançaram esse propósito. No fim desse ano o governo luso quase cedeu Pernambuco e Angola aos holandeses, mas o plano foi desfeito.
No ano de 1651 os portugueses tomaram as terras de Cória e Valência de Alcântara, contudo não conseguiram obter as vilas. Três anos depois os embates diminuíram, mas multiplicaram-se em 1656 e 1657.
A morte do rei João IV de Portugal em 1656 marcou o começo da regência da sua esposa Luísa de Gusmão (1613-1666). O momento foi seguido de uma crise sucessória e pelo golpe palaciano de 1662. Vários nobres lusos não estavam de acordo com a sucessão.
Portugal continuou no encalço do seu objetivo de firmar um pacto formal com França. Após a assinatura desse tratado e com o fim das hostilidades na Catalunha, Espanha concentrou as suas forças em Portugal, que padecia com a falta de homens e recursos para o combate. A conquista dos galegos sobre a Lapela, em 1658, trouxe a oportunidade para os espanhóis acometerem a recuperação de Portugal, mas os portugueses solicitaram ajuda internacional para evitar essa ação.
Terceira fase (1656-1659)
Com o fim da insurreição castelhana e a morte do rei português João IV, levando à regência da rainha dona Luísa de Gusmão, ocorreram sérios problemas para a Corte lusitana. Com a política instável parecia o momento ideal para ofensiva dos governantes espanhóis. Para isso organizaram um plano de ofensiva militar no qual entrariam em Lisboa através do Alentejo e acabariam com a façanha do Duque de Alba em 1580. A tarefa ficou a cargo do Duque de San Germán que deveria recrutar 18 mil infantes e 4 500 cavalos.
Em 1657 os principais focos de luta foram em Badajoz e Olivença, aproveitaram o número reduzido de homens para atacar Alcântara na primavera do mesmo ano. No ano seguinte cercaram Badajoz, mas a estratégia não foi bem-sucedida, causando uma situação embaraçosa para a monarquia hispânica, tendo pouca interferência no desenvolvimento da guerra.
As fortificações tiveram grande importância na guerra, um exército liderado por Felipe IV com 19 mil homens saiu vitorioso da tentativa do general Luís de Haro e seus dezoito soldados de apoderar-se de Elvas durante três meses. Esta situação possibilitou ao exército português uma melhor organização e assim a 14 de janeiro de 1659 Haro e seus soldados foram derrotados.
Após a assinatura do tratado dos Pirineus em 1659, Espanha voltou a ameaçar a independência de Portugal. Os espanhóis pretendiam transportar uma parcela do exército de Flandres para outras forças mais experientes, caso contrário poderia ocorrer uma invasão.
Mas os espanhóis enfrentaram algumas dificuldades para mandar as tropas de Flandres para Península Ibérica. O primeiro grupo de soldados, com quatro mil infantes e quatrocentos ginetes, partiram de Ostende até a península em fevereiro de 1662. As dificuldades financeiras do exército de Flandres - sendo que dependiam da ajuda externa - não levaram Madrid a solicitar menos navios e soldados frente à ofensiva portuguesa. Espanha enfrentava problemas internos para manter a unidade, devido à escassez de recursos e o cerco formado em Castilha, que fomentava grande miséria.
A possessão portuguesa em Elvas foi debilitada após Juán José se apoderar de Arronches, que ficava a vinte e sete quilómetros do rio Caia. Após a perda de Arronches os portugueses mudaram o exército do Alentejo para Estremoz. Com a finalidade de combater em força Portugal, as forças espanholas organizaram três exércitos: o de Badajoz, comandado por Juan José de Áustria, filho de Felipe IV, e que atacaria a partir da Estremadura; o exército da Galiza sob o encargo do Marquês de Viana e o da Cidade Rodrigo com o duque de Osuna.
Em 1663 a Áustria conquistou Juromenha e no dia 8 de junho do mesmo ano Juan José foi derrotado pelos portugueses na Batalha de Ameixal. Em junho de 1664, Valencia de Alcântara ficou sob o poder dos portugueses até fevereiro de 1668. Esta foi a principal conquista lusitana, frente às tentativas de obter Albuquerque e Badajoz.
Sobre as ordens de António Luís Menezes a coluna portuguesa abateu-se na Batalha de Montes Claros a 17 de junho de 1665. No mesmo ano, os portugueses desencadearam uma ofensiva na Galiza, coincidindo com a subida ao trono de Carlos II, o principal objetivo era apoderar-se do porto de Vigo, ao ocuparem o vale de Rosal conseguiram render La Guardia.
A morte do rei Felipe IV levou a falta de recursos para empreender novas ofensivas. Perante a estagnação a frente de batalha reuniu-se em 1667, protagonizando a Guerra de Devolução. A rainha regente, ao contrário dos ministros, não se resignava diante de uma possível perda de Portugal. Portugal havia solicitado uma trégua – face à vitória na Batalha de Montes Claros - e a firmação do Tratado de Lisboa em 1668, entre a França e Portugal determinaram o fim do conflito. Os Habsburgos espanhóis reconheceram então a independência de Portugal. A Casa de Bragança passou a ser a nova dinastia de Portugal a 13 de fevereiro de 1668. A paz foi firmada no convento de San Eloy de Lisboa.
Resultados de 1640 a 1688
Com a proclamação de D. João IV, Portugal perdeu a sua influência na Europa, pois estava agora fora da aliança do Império Habsburgo. D. João IV não conseguiu ser reconhecido como rei, em Roma, devido à forte influência espanhola junto de Itália. O reconhecimento viria em 1688.
Em 1654, após perder a disputa com os ingleses, Portugal é obrigado a assinar o Tratado de Westminster, aceitando assim a abertura dos portos para o comércio entre os ingleses e as colónias portuguesas e a liberdade de culto para os ingleses em território luso. Além disso, com a restauração dos Stuarts no trono, em 1660, foi arranjado casamento entre Carlos II e a filha de D. João IV, Catarina de Bragança. O Tratado de 23 de junho de 1661, determinou que os Reinos inglês e português voltassem a ter uma relação de amizade.
Grande parte do dinheiro que foi conseguido nesse período proveio de origem judaica, através de empréstimos. Para além disso passaram, da Inquisição para o Estado, o controle dos bens conquistados e das pessoas que teriam sido sentenciadas pela Inquisição. Com a escassez de dinheiro, Portugal tinha dificuldade em proteger as suas possessões de além-mar. Com a morte de D. João IV em 1656, o governo foi compartilhado com um pequeno grupo de conselheiros.
D. Afonso VI assumiu o trono ainda menor de idade e como era incapaz de reinar, sua mãe - D. Luísa de Gusmão – tornou-se regente. Para conter os gastos, foi criado pela Rainha uma forma de cobrar mais impostos. A oposição à Rainha aumenta com esta medida. Em 1662 sofre um golpe de governo e a governação passa para a figura do Rei, instalando-se um governo de ministérios. D. Luís de Vasconcelos e Sousa - conde de Castelo Melhor - passa a ocupar o cargo de primeiro-ministro e D. António de Sousa e Macedo toma o controle da Secretaria do Estado.
Com isso Portugal consegue ganhar algumas batalhas e manter-se como nação. Nesta altura vence a Batalha de Montes Claros, em 1665. Para manter o trono o conde de Castelo Melhor, arranja, em 1666, casamento entre D. Afonso VI com a princesa francesa Maria Francisca de Nemour - Mademoiselle d’Aumale. É assinado um tratado com os franceses, em 1667, para juntos tentarem combater a Espanha. Mas a nova Princesa apaixona-se por D. Pedro - irmão do Rei D. Afonso VI, e consequentemente, o conde Castelo Melhor perde o apoio dos franceses, e ocorre a saída de Sousa e Macedo - que era amigo dos ingleses.
Com todos estes acontecimentos, em 1667 ocorre um novo golpe entre D. Pedro e o duque de Cadaval. O conde Castelo Melhor é afastado bem como os seus partidários. D. Pedro - que assumiu o título de príncipe regente – é preso, depois de ter casado, em 1668, com D. Maria Francisca. Filipe IV de Espanha acaba por morrer e é o seu filho, de quatro anos, Carlos II, que ascende ao trono. Então em 1668 é assinado o Tratado de Lisboa, que tinha como objetivo estabelecer a paz entre Espanha e Portugal, além de promover o reconhecimento de Portugal como Reino - Ceuta permaneceu fiel a Espanha.
Feriado
Em Portugal, a primeira comemoração oficial da Restauração da Independência deu-se em 1823, no recinto do Picadeiro Real do Palácio de Belém (hoje Museu Nacional dos Coches), com a presença de D. João VI. O acontecimento deu-se não a 1º de Dezembro mas no dia 3, por "dificuldades grandes", segundo a Gazeta de Lisboa. Foram convidados embaixadores estrangeiros, oficiais da Marinha e do Exército, "as pessoas mais conspícuas da Capital, de todas as hierarquias"- Foi organizado um baile que durou até de madrugada e uma sumptuosa ceia foi servida no Palácio. Houve um evidente aproveitamento político das celebrações pela facão afeta ao Infante D. Miguel e ao regresso do absolutismo real.
O dia 1 de dezembro é feriado desde a segunda metade do século XIX, sendo o feriado civil mais antigo, tendo sobrevivido à Primeira República, ao Estado Novo e à chegada da democracia.
Menos de uma semana após a revolução republicana de 1910, um decreto acabou com os feriados religiosos e instituiu apenas cinco dias de "folga nacional". Os republicanos aceitaram apenas uma celebração civil vinda da monarquia: o feriado que marca a Restauração da Independência, em relação a Espanha.
É costume comemorar-se este feriado na Praça dos Restauradores, em Lisboa com honras de Estado onde também se comemora o Dia da Bandeira. Em 2012, o XIX Governo Constitucional, apoiado por uma maioria PSD-CDS e liderado por Passos Coelho, suspendeu o feriado no dia da semana a partir de 2013. Esta medida, inicialmente anunciada como abolição, foi posteriormente restituída. O objetivo da medida, conforme a declaração do Governo seria o de "acompanhar, por esta via, os esforços de Portugal e dos portugueses para superar a crise económica e financeira que o País atravessa". O feriado foi reposto em Janeiro de 2016, com os votos do XXI Governo Constitucional liderado por António Costa e com o apoio parlamentar dos partidos de esquerda.
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