Regente - Luísa de Gusmão
Luísa Maria Francisca de Gusmão e Sandoval (em espanhol: Luisa María Francisca de Guzmán y Sandoval; Sanlúcar, 13 de outubro de 1613 — Lisboa, 27 de fevereiro de 1666), pelo seu casamento com João IV, na altura ainda Duque de Bragança, veio a ser a primeira Rainha consorte de Portugal da Casa de Bragança.
Duquesa de Bragança
Da Casa Ducal de Medina-Sidónia, Dona Luísa era filha de João Manuel Peres de Gusmão, 8º duque de Medina-Sidónia e de Joana Lourença Gomes de Sandoval e Lacerda, os senhores mais poderosos de Huelva y Sanlucar de Barrameda. Descendia dos reis de Portugal por via paterna - a sua avó Ana de Silva e Mendonça, filha do príncipe de Éboli era descendente de D. Afonso Henriques) - e por via materna - a sua outra avó, Catarina de Lacerda, descendia de D. Afonso I de Bragança. Era, também, descendente por bastardia de Fernando o Católico pelo seu avô paterno e de São Francisco de Borja e novamente por bastardia de Fernando o Católico pelo seu avô materno.
Em 1621, na subida ao trono de Filipe IV, o plano de incorporação de Portugal na Coroa de Espanha tinha já realizado duas fases: a fase da união pela monarquia dualista jurada em Tomar (1581) por Filipe II, prometendo o respeito pela autonomia do Governo de Portugal; e a fase da anexação, entretanto operada durante o reinado de Filipe III (1598-1621).
No início do reinado de Filipe IV faltava apenas consumar a absorção de Portugal. Na Instrução sobre o governo de Espanha que o Conde-Duque de Olivares apresentou ao rei Filipe IV, em 1625, tratava-se do planeamento e da execução dessa fase final da absorção. O conde-duque indicava três caminhos:
1º - Realizar uma cuidadosa política de casamentos, para confundir e unificar os vassalos de Portugal e de Espanha;
2º - Filipe IV realizar cortes temporárias em Lisboa;
3º - Abandonar a letra e o espírito dos capítulos das Cortes de Tomar (1581), que colocava na dependência do Governo autónomo de Portugal os portugueses admitidos nos cargos militares e administrativos do Reino e do Ultramar (Oriente, África e Brasil), passando estes a ser vice-reis, embaixadores e oficiais palatinos de Espanha.
Dos três caminhos indicados, aquele que era o mais difícil de realizar era o da política de casamentos. O casamento de Dona Luísa de Gusmão com o Duque de Bragança surgiu como uma oportunidade a não perder. Juntando duas importantes Casas Ducais, uma de Espanha e a outra de Portugal, esperava-se por seu intermédio vir a impedir o levantamento de Portugal contra a Dinastia Filipina.
Dona Luísa de Gusmão, porém, apoiou a política do marido na rebelião contra Espanha. Tê-lo-á mesmo incitado a aceitar a Coroa do Reino de Portugal, nem que para isso fossem precisos grandes sacrifícios. O conde da Ericeira atribuiu à duquesa Dona Luísa o propósito "mais acertado de morrer reinando do que acabar servindo", a partir do qual os adversários da autonomia portuguesa fizeram depois sonoras frases ao gosto popular, como a de que ela teria afirmado, "melhor ser Rainha por um dia, do que duquesa toda a vida". Segundo a opinião de Veríssimo Serrão, «não é de manter-se a falsa tradição que fez dela um dos «motores» da Restauração, mas não oferece dúvida que se identificou com o movimento e soube enfrentar os sacrifícios com ânimo varonil».
Rainha de Portugal
Após a aclamação, instalou-se em Lisboa com os filhos, vivendo para a sua educação. No entanto sempre participou na governação. Um exemplo foi, aquando da revolta de 1641, deu um parecer que visava o não perdão aos culpados, mesmo sabendo inocente o duque de Caminha. Exerceu governo sempre que o rei acorria à fronteira do Alentejo, como em julho de 1643, auxiliada nos negócios públicos por D. Manuel da Cunha, bispo capelão-mor, Sebastião César de Meneses e o marquês de Ferreira.
Desde muito cedo, as rainhas de Portugal contaram com os rendimentos de bens, adquiridos na sua grande maioria por doação. Às rainhas cabiam tenças sobre a receita das alfândegas, a vintena do ouro de certas minas, para além dos rendimentos das terras de que dispunham e a nomeação dos respetivos ofícios.
No entanto e de acordo com o estipulado nas Ordenações Manuelinas, as doações feitas às rainhas, mesmo quando não reservavam para o monarca nenhuma parte da jurisdição cível e crime, deviam ser interpretadas com reserva da mais alta superioridade e senhorio para o rei. Para além de estipularem as formas de exercício da jurisdição das rainhas, determinavam o regimento do ouvidor, que era desembargador na Casa da Suplicação.
Após o período de domínio filipino, durante o qual cessara o estado, dote e jurisdição das rainhas, D. João IV determinou que sua mulher, D. Luísa Gabriela de Gusmão, detivesse todas as terras que tinham pertencido à anterior rainha D. Catarina: (Silves, Faro, Alvor, Alenquer, Sintra, Aldeia Galega e Aldeia Gavinha, Óbidos, Caldas da Rainha e Salir do Porto), com as respetivas rendas, direitos reais, tributos e ofícios (vedor, juiz, ouvidor e mais desembargadores, oficiais dos feitos de sua fazenda e estado), padroados, e toda a jurisdição e alcaidarias mores, de acordo com a Ordenação manuelina.
Por Carta de 10 de janeiro de 1643 foram confirmadas as doações e jurisdição das rainhas. A 9 de fevereiro do mesmo ano, foram doadas a D. Luísa as terras da Chamusca e Ulme, mais bens pertencentes ao morgado Rui Gomes da Silva e ainda o reguengo de Nespereira, Monção e Vila Nova de Foz Côa.
D. Luísa, por Decreto de 16 de Julho de 1643, criou o Conselho ou Tribunal do Despacho da Fazenda e Estado da Casa das Senhoras Rainhas, constituído por um ouvidor presidente, dois deputados, um provedor, um escrivão e um porteiro. O Regimento do Conselho da Fazenda e Estado, outorgado em 11 de Outubro de 1656, fixou a existência de um vedor da Fazenda, um ouvidor e dois deputados, um dos quais ouvidor geral das terras das rainhas, um procurador da Fazenda e respetivo escrivão, um chanceler e um escrivão da câmara. Esse regimento viria a ser confirmado por alvará de 11 de Maio de 1786.
A Casa teve administração independente até 1769. Por decisão do Marquês de Pombal, de 25 de janeiro de 1770, os seus rendimentos passaram a ser geridos pelo Erário Régio, sendo, no entanto, as despesas autorizadas pela rainha. Por Decreto de 31 de outubro de 1823, foram reorganizados o Conselho ou Tribunal do Despacho, a Secretaria dos Negócios e o Tesouro, corrigindo as alterações introduzidas pela anterior reforma e pelo governo revolucionário. A reforma entrou em vigor em 1 de janeiro de 1824.
Regente de Portugal
No testamento do esposo, D. Luísa foi nomeada regente durante a menoridade de D. Afonso VI, aclamado no Paço da Ribeira a 15 de novembro de 1656, aos 13 anos. Era voz corrente que D. Afonso sofria de grave doença, pelo que chegou a pensar-se no adiamento da cerimónia.
A regente procurou organizar o governo de modo a impor-se às facões palacianas em jogo. Nomeou D. Francisco de Faro e Noronha, conde de Odemira, para aio do monarca e manteve os ofícios da casa real nas mãos dos que os exerciam no tempo do marido. Os negócios públicos continuaram com os secretários de Estado e Mercês, Pedro Vieira da Silva e Gaspar de Faria Severim.
Mas a rivalidade entre o conde de Odemira e D. António Luís de Meneses, conde de Cantanhede, dificultou a sua ação. Viu-se assim coagida a nomear a chamada Junta Noturna (por ter reuniões à noite) com vários conselheiros da sua confiança. Além dos dois nobres, havia ainda o marquês de Nisa, Pedro Fernandes Monteiro, o conde de São Lourenço e, o principal, Frei Domingos do Rosário, hábil diplomata. O sistema durou ao longo da regência, útil para a boa marcha dos negócios públicos.
Durante a sua regência houve a grande vitória portuguesa das Linhas de Elvas, em 14 de Janeiro de 1659, batalha decisiva porque a derrota implicou a perda de Lisboa. Não foi uma vitória decisiva, pois o Tratado dos Pirenéus iria deixar Espanha sem outros compromissos militares e Portugal voltaria a sentir ameaças mais graves.
O partido afeto a D. Afonso VI lançou-se abertamente na luta contra a regente, sob a orientação de D. Luís de Vasconcelos e Sousa, 3.º conde de Castelo Melhor. Em 1661, a rainha quis abandonar o governo, chegando a redigir um papel para justificar a sua atitude e a «monstruosidade que representava o reino com duas cabeças». Mas temendo a desastrosa administração de seu filho, resolveu manter-se na regência.
A aliança com Inglaterra, assinada em 1662, foi uma das suas obras de destaque, bem como a organização das forças que, no ano seguinte, já no governo de D. Afonso VI, vieram a obter as vitórias da Guerra da Restauração. A viúva de D. João IV defendeu os princípios de liberdade e independência da restauração e manteve-se no governo, receosa de que o filho mais velho o comprometesse.
Faleceu aos 52 anos. Jaz no Panteão dos Braganças, no Mosteiro de São Vicente de Fora em Lisboa, para onde foi trasladada do Convento de Xabregas.
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