Fundação do bairro
1567, o ano do início de Santa Cruz
Texto por Guaraci Rosa
A formação de um bairro não ocorre da noite para o dia; ela abraça elementos de pertencimento, culturais, sociais, demográficos e territoriais. Em Santa Cruz, essa realidade não foi (é) diferente, uma vez que o bairro se enreda em um processo histórico e geográfico, passando por inúmeras transformações, consolidando-se como um dos maiores da cidade do Rio de Janeiro.
A história do bairro remonta ao século XVI, mais precisamente a 1567, quando Cristóvão Monteiro, por ter colaborado na expulsão dos franceses e indígenas, recebeu as terras que pertenciam a Martim Afonso de Souza (administrador português). Essas terras constituíam uma parte desmembrada da sesmaria de São Vicente.
Esse processo de formação, iniciado em 1567, passou por várias mudanças ao longo dos anos. A primeira delas ocorreu após o falecimento de Cristóvão Monteiro, quando sua viúva, Marquesa Ferreira, e sua filha, Catarina Monteiro, herdaram as terras. Em 1589, a viúva doou uma parte das terras aos jesuítas para que estes intercedessem pela alma de seu falecido marido e, posteriormente, pela dela própria.
No ano de 1590, os padres jesuítas conseguiram negociar com Catarina e seu marido, José Adorno, a aquisição do restante da propriedade, em uma permuta envolvendo terras na cidade de Bananal, em São Paulo. A partir desse momento, a formação de um imenso latifúndio teve início, pois os jesuítas passaram a adquirir diversas terras, transformando tudo em um vasto domínio que se estendia de Sepetiba até Vassouras, abrangendo o município de Itaguaí e alcançando Itacuruçá, um distrito de Mangaratiba. Vale ressaltar que o trabalho indígena e a escravidão de pessoas negras desempenharam um papel fundamental nesse contexto.
José de Saldanha da Gama, autor de História da Imperial Fazenda de Santa Cruz, obra publicada na Revista do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, relatou que os padres jesuítas ergueram uma imensa cruz de madeira do lado de fora da residência em que viviam, originando assim o nome Santa Cruz.
Por quase dois séculos, os jesuítas dominaram a fazenda, até serem expulsos em 1759 pelo Marquês de Pombal, momento em que a fazenda mudou de mãos e passou para o domínio português, durante o período dos vice-reis.
Em 1808, a família real portuguesa chegou ao Brasil, desencadeando grandes mudanças e expansões na sede da fazenda. O antigo convento dos jesuítas se transformou no Palácio Real de Santa Cruz. A forte relação de D. João VI com o bairro resultou em importantes melhorias, como a renovação do Caminho dos Jesuítas e a criação da Estrada Real de Santa Cruz.
Com a independência do Brasil, em 1822, e a consequente formação da Fazenda Imperial de Santa Cruz, o bairro se separou de Itaguaí, surgindo o curato de Santa Cruz. Em 1878, a linha férrea alcançou o bairro, e, seguindo esse período de melhorias, o matadouro foi inaugurado em 1881, trazendo benefícios significativos para a economia local.
O século XX trouxe ainda mais transformações, incluindo a construção de um hangar para dirigíveis (zepelins), um aeroporto, o desmembramento da fazenda, melhorias em saneamento, o crescimento da agricultura, a chegada de imigrantes em núcleos coloniais, a transformação da sede da fazenda em um batalhão de engenharia do exército, a criação de uma zona industrial, a construção da avenida Brasil, o desenvolvimento de conjuntos habitacionais e a formação de favelas. No entanto, neste século, problemas sociais, como pobreza, violência e miséria, também se tornaram mais evidentes.
O século XXI chegou, mas os desafios persistem. Todos esses fatores, ao longo dos séculos, moldaram o Santa Cruz atual, mas o processo de evolução nunca cessou, uma vez que a história é contínua e sempre mutável.
REFERÊNCIAS
FREITAS, Benedicto. Santa Cruz: Fazenda jesuítica, real e imperial. Volume I. Rio de Janeiro: Edição do Autor, 1985.
SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE MUSEOGRAFIA E ARQUITETURA DE MUSEUS - PESQUISA E PATRIMÔNIO, 6. 2019, Recife/Petrópolis/Rio de Janeiro. NOGUEIRA, Elizabeth. A história de Santa Cruz, Rio de Janeiro, contada pelo seu patrimônio arquitetônico e cultural. Anais [...] Recife/Petrópolis/Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: https://arquimuseus.arq.br/seminario2019/pdf/artigos/eixo_4-patrimonio_e_educacao/e4a5_nogueira.pdf. Acesso em: 27 ago. 2023.
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