Vale do Paraíba e o Café
Resumo
Início do plantio de café no Vale do Paraíba, onde avançou pelas terras altas do interior da Mata Atlântica, substituindo vastos trechos de floresta nativa.
Sugestão para o professor
Para discutir o abandono do Vale do Paraíba após o esgotamento dos solos pela cafeicultura, a degradação ambiental e a decadência social provocadas pela migração da cultura cafeeira para regiões mais férteis, o/a professor/a por trabalhar com o conto Cidades Mortas, de Monteiro Lobato (1906).
Caminhos da Reportagem – Vale do Paraíba (TV Brasil, 2017, https://www.youtube.com/watch?v=vHoXmE_skjA ). 50’ 49’’,
Um registro sobre a história, a natureza e as atividades de pessoas que buscam se reinventar nessa região, que já foi a mais importante do Império brasileiro e que, no final do XIX, entrou em decadência e esquecimento.
Detalhamento da linha do tempo do estudante
Por volta dessa época, houve o início do plantio de café no Vale do Paraíba – um acidente geográfico natural, localizado entre o sul do estado do Rio de Janeiro e o litoral norte de São Paulo. Abastecida pela bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul, os “mares de morros” que caracterizam o relevo dessa região a tornaram “um ambiente adequado, se não ideal”, para o cultivo do café. Por seu uma planta do sub-bosque etíope, o café transpira continuamente, mas não tem nenhum mecanismo para armazenar umidade. Ela precisa, portanto, retirar umidade do solo, a uma profundidade de três metros ou mais. Por isso, ela não se desenvolveu tão bem ao longo do litoral brasileiro (como o açúcar, por exemplo), “onde pode ter sofrido um pouco com os ventos salinos oceânicos” e as altas temperaturas (Dean, 1996, p. 195). Nessa época, acreditava-se que o café tinha de ser plantado em solo coberto por floresta “virgem”, onde a camada de húmus e as substâncias orgânicas garantiam a fertilidade do solo e o crescimento de árvores imponentes. Por outro lado, o capital e o trabalho eram escassos demais para serem empregados na adubação e outros cuidados com solos considerados menos férteis.
Por isso, ainda que o café seja uma planta perene, isto é, que pode permanecer produtiva por até 30 anos, no vale do Paraíba as “plantações velhas não eram replantadas, mas abandonadas, e novas faixas de floresta primária eram então limpas para manter a produção. O café avançou, portanto, pelas terras altas, de geração para geração, nada deixando em seu rastro além de montanhas desnudas” (Dean, 1996, p. 196).
Com isso, podemos dizer que o café interiorizou o processo de colonização do Brasil, até então limitado ao litoral atlântico, ao mesmo tempo tornando-o mais “vertical”. Em pouco mais de 80 anos (entre 1800 e 1889), a população brasileira residente na Mata Atlântica saltou de 3 milhões para 14 milhões de habitantes, aproximadamente.
O desenvolvimento da cultura do café subverteu definitivamente a geografia colonial. Ela venceu a barreira geográfica das serras litorâneas e estendeu vastamente o regime do latifúndio escravagista pela hinterlândia, seguindo os vales dos rios para estabelecer-se amplamente no planalto, nas províncias de Minas Gerais e São Paulo, alcançando pouco tempo depois o Espírito Santo. Na primeira metade do século XX, a cafeicultura atingiria o norte do Paraná (CASTRO, 2003, p. 48-49).
Além do avanço para o interior e para as montanhas da Mata Atlântica, o café passou a substituir extensos trechos de florestas, pois a prática corrente dos fazendeiros era plantar café em quantidade, economizando assim trabalho e capital.
Durante quase todo o século XIX, o Brasil ainda contava com tantas terras cobertas de florestas primárias, que se tinha a impressão de serem elas um recurso infinito, inesgotável. Por outro lado, o Brasil encontrou nos EUA uma população em crescimento e uma economia em expansão, aberta ao consumo e pouco exigente à qualidade café brasileiro. Parecia não haver limites para o seu plantio. Mas, o “progresso” trazido pela economia cafeeira cobrou seu preço. Os altos lucros advindos da exportação do café possibilitaram a industrialização e a urbanização do país, mas a técnica (derrubada-queimada), os solos, a mentalidade e, sobretudo, a mão de obra (preferencialmente, escrava) empregados em seu plantio deixaram uma imensa tragédia ambiental e uma enorme dívida social. “Trabalhando de baixo para cima a partir da base da montanha, brandiam os machados sucessivamente contra cada árvore, talhando até que o tronco, ainda inteiro, gemesse com a iminência de sua queda. Um capataz experiente observava cuidadosamente a rampa da montanha, a posição de cada árvore e os cipós – abundantes nesse setor da MA – que prendiam cada uma a sua vizinha, e dirigia o corte de forma a cada árvore ficar posicionada para cair em uma direção precisa. Os lenhadores iam subindo, talhando em um e depois em outro tronco, cada vez mais acima, até que se chegava ao cume. Então, a tarefa do capataz era decidir qual a árvore-mestra, a gigante que seria cortada até o fim, carregando consigo todas as outras” (Dean, 1996, p. 197-8).
Curiosidades: O Café
Apesar de todas as nossas diferenças, saborear um café quentinho é hábito comum a praticamente todo o povo brasileiro. A bebida é tão presente em nosso cotidiano que, por aqui, dá até nome a uma das principais refeições do dia: nosso café-da-manhã. Mas você já se perguntou o que estaria por trás de todo aquele aroma e sabor? Ficou curioso para saber um pouco mais sobre essa paixão nacional?
O café que bebemos todos os dias representa uma infusão em água quente de sementes moídas e torradas do cafeeiro: um arbusto perene, ou seja, com longo ciclo de vida que pode atingir até cerca de 30 anos de produção, e porte variado. Das mais de 120 espécies de cafeeiro (plantas do gênero Coffea), apenas duas têm sido significativamente exploradas economicamente na produção do café: Coffea arabica (café arábica) e Coffea canephora (café robusta ou conilon), representando 64% e 36% de todo café consumido no mundo, respectivamente. Isso mesmo, toda aquela variedade que observamos nas prateleiras dos supermercados são apenas variações dessas duas espécies: cafés Acaiá, Bourbon, Catuaí, Caturra, Mundo Novo, dentre outros, são variedades de Coffea arabica; enquanto o Conilon, Guarani, Itapoatã e Robusta são variedades de C. canephora.
Essas variedades foram alcançadas de maneira artificial. Em diferentes localidades, cafeeiros com características favoráveis ao aumento da quantidade e qualidade foram sendo gradativamente selecionados para obtenção de novas mudas. Como resultado, surgiram variedades distintas com características propícias ao clima, às pragas e às doenças de determinadas regiões. Além desses tipos de resistência, as variedades também passaram a ser selecionadas em função do sabor, aroma e teor de cafeína da bebida produzida. A essas seleções ao longo das gerações de plantas, dá-se o nome de melhoramento genético! É claro que, hoje em dia, com os avanços das técnicas moleculares, esse processo tem se tornado cada vez mais eficaz e sofisticado.
Ambas as espécies são originárias da África, sendo Coffea canephora típica de terras mais baixas e quentes, como as encontradas na região ocidental do continente, enquanto C. arábica, por sua vez, teria surgido em terras mais altas e de clima ameno, como as encontradas na Etiópia, região oriental do continente. Não é à toa que, no Brasil, o cultivo de C. arábica também é mais propício em altitudes mais elevadas e de clima ameno, ao passo que C. canephora se dá melhor em terras mais baixas e quentes. E a essa altura, você talvez já esteja se perguntando: “- poxa, somos o maior produtor de café do mundo e não possuímos uma única espécie sequer de cafeeiro natural do território brasileiro?” Isso mesmo, apesar de toda nossa produção, o café só veio a ser introduzido no Brasil a partir do século XVIII.
Naturalmente, você também deve estar se questionando: “- mas afinal, qual a diferença entre o café arábica e conilon?". Pois bem, para além das diferenças morfológicas, fisiológicas e genéticas, vamos ao que interessa: nosso cafezinho! Nesse sentido, o café arábica tende a possuir maior teor de açúcar, menos cafeína, e elevada complexidade de sabores e aromas. Assim sendo, é a partir dessa espécie que produzimos os cafés mais finos, incluindo os famosos cafés gourmet. O café conilon, por sua vez, é amplamente utilizado na produção de cafés do tipo solúvel. Mas não pensem que é sempre assim, um ou outro. Basta um olhar mais atento e notaremos que as prateleiras dos supermercados também estão repletas de pacotes contendo blends, ou seja, uma mistura de grãos pertencentes a essas duas espécies. Trata-se de uma estratégia de barateamento do produto, já que o C. canephora tende a possuir maior produtividade e resistência a pragas e doenças, costumando ser, com isso, mais barato. Assim, fica a dica: há exceções, mas cafés 100% arábicas costumam ser considerados de melhor qualidade e mais ricos em sabores e aromas.
Referências
DEAN, Warren. A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
CABRAL, Diogo C. 'O Brasil é um grande formigueiro’: território, ecologia e a história ambiental da América Portuguesa –parte 2. HALAC. Belo Horizonte, volumen IV, numero 1, setiembre 2014-febrero 2015, p.87-113.
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